Motociclista, acenai-vos!

MOTOCICLISTAS, ACENAI-VOS!

Mês passado fui ao Rio de Janeiro a trabalho e decidi parar em um estacionamento próximo ao aeroporto. Ao chegar lá, outro motociclista parava no mesmo estacionamento com uma moto bem diferente da minha. Fiz um aceno com o capacete e com a luva. Retribuiu. Foi o suficiente para ele se aproximar e perguntar sobre um acessório da minha moto. Conversa de moto vem, conversa vai, e durante o traslado para o aeroporto, conversamos sobre outros interesses de negócio.

Cena dois: luz verde no painel, pé direito no chão, luz vermelha no alto do poste, estou eu a esperar os pedestres passarem. No cruzamento ao lado, outro motociclista olha em minha direção e timidamente levanta a mão acenando. Distraído, olho para o lado, é comigo mesmo, retribuo e sinto um conforto sutil e inexplicável.

Bem, dá para relatar várias cenas semelhantes. Como dizia o Sérgio Britto dos Titãs: “desde os primórdios até hoje em dia o homem ainda faz o que o macaco fazia”.  Acenar é singelo e primordial, mas ao mesmo tempo pode ser denso, carregar mensagens.

Voltando ao nosso cenário de trânsito, imagine esses mesmos acenos sob a perspectiva de um carro. Nem Alice parada no trânsito do país das maravilhas presenciaria! Aí, meu camarada, esses dois mesmos mamíferos provavelmente teriam o repertório de sinais manuais reduzidos ao dedo médio em riste, ou à junção da ponta do indicador com o topo do polegar, simbolizando partes pudicas do corpo. Impressionante como a configuração mental muda quando se trata de dois (ou mais) motociclistas.

Na estrada é mais comum ainda, pilotos da pista contrária acenam e enfatizam com um relampejar de farol. Muitos postos de beira de estrada viram quase clubes informais de motociclistas desconhecidos. Em veículos de quadro rodas, na maioria das vezes, o motorista nem liga para os carros do estacionamento, entra no posto calado, come seu frango empanado com tubaína, compra um pão de semolina, vai ao banheiro e volta para a estrada do mesmo jeito que entrou.

Claro que, dependendo da pessoa e da situação, a interpretação muda. A língua escrita é só uma tentativa de aproximação à realidade, mas vou me arriscar a dizer em palavras tortas que o aceno, em essência diz: “estamos na mesma condição frente ao asfalto, às intempéries, e compartilhamos um equipamento semelhante”. Identificação. Não nivela as camadas socioeconômicas, simplesmente as ignora. Tudo isso em segundos, sem dor, sem custo, só uma levantada de mão rápida, um meneio com o capacete, um relampejar, uma olhada. Tem a ver com companheirismo incondicional.

Agora, existe ainda uma segmentação, meio que elitista, meio embotada, que impõe que pilotos de uma marca ou cilindrada só acenem para outros que tiverem montaria semelhante. Bah! Bobagem! Mas não tem nada não, tem gente que precisa levar muito inseto na viseira e tomar muito banho de São Pedro na moleira pra deixar de pilotar o ego, e sim a moto.

Portanto, conclamo: motociclistas, acenai-vos! Keep riding!

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